Uma das coisas mais legais de termos a sede da Fundação SOS Mata Atlântica na Avenida Paulista, um dos pontos mais altos da cidade de São Paulo, é poder fazer uma pausa no final da tarde e passar uns minutinhos olhando pela janela. A cada dia, é um pôr do sol mais bonito que o outro, principalmente nesse período mais seco, quando o entardecer fica ainda mais avermelhado e surge uma variedade de tons entre o azul e o amarelo. A parte ruim é que essa beleza toda não é algo a ser comemorado, pois está relacionada à grande quantidade de poeira na atmosfera. A equação é simples: quanto mais bonito o entardecer, provavelmente mais impróprio estará o ar da cidade.
Se a interferência dessa poluição estivesse apenas no colorido do céu, menos mal. Mas o que do lado de dentro da janela embeleza os olhos, do lado de fora entope o nariz, irrita a garganta, prejudica a pele e é assunto a ser levado a sério, pois afeta diretamente o bem-estar, a qualidade de vida e principalmente a saúde de quem vive nessas áreas. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), só em 2012, a poluição atmosférica foi responsável pela morte de 3,6 milhões de pessoas no mundo.
No Estado de São Paulo, a poluição do ar matou mais de 17 mil pessoas em 2011. Na capital, que tem duas vezes e meia mais poluição que o máximo recomendado pela OMS (10 microgramas por metro cúbico) foram 4.655 óbitos, número três vezes maior que o de mortes no trânsito (1.365) no mesmo período. Crianças, idosos e adultos com doenças cardiorrespiratórias prévias são as principais vítimas. Os dados são do levantamento Avaliação do impacto da poluição atmosférica sob a visão da saúde no Estado de São Paulo, realizado pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade em 2013.
Dados como esse evidenciam como o monitoramento é fundamental para manter a qualidade do ar segura para as pessoas. Desde 1989, é obrigatório no país o acompanhamento dos níveis de qualidade do ar, por meio do Programa Nacional de Controle da Qualidade do Ar (PRONAR), e a comparação com os padrões estabelecidos pela OMS. Passados 25 anos, apenas 1,7% dos municípios brasileiros são cobertos pelo monitoramento, sendo que 79% desse total está na região Sudeste, como aponta o Instituto Saúde e Sustentabilidade. Já o Instituto de Energia e Meio Ambiente aponta que apenas 12 Estados fazem monitoramentos com alguma periodicidade, porém ainda há problemas na maneira como os dados são coletados e apresentados.
Nós, na SOS Mata Atlântica, já fizemos uma campanha para alertar a população sobre a importância desse monitoramento. Em 1996, lançamos o “Respira São Paulo”, uma campanha na qual distribuímos lençóis brancos acompanhado de uma tabela de cores correspondentes aos níveis de poluição. A ideia era que as pessoas colocassem o lençol nas janelas de suas casas e escritórios para acompanhar sua mudança de coloração e, assim, medir a poluição em diversas regiões da cidade. Obviamente, não demorava muito para os lençóis passarem de branco para diferentes tonalidades de cinca e marrom. Em 2011, a TV Globo lançou em parceria conosco a campanha RespirAR, na qual adotou a mesma metodologia e fez um grande trabalho de informação e educação ambiental em vários bairros de São Paulo.
As razões de tantas partículas em suspensão no céu já são velhas conhecidas, como a emissão de gases pela indústria e, claro, o grande vilão: os automóveis. No caso de São Paulo, para ser mais precisa, os 7,6 milhões de carros, motos, ônibus e caminhões presos e suas fumaças pretas nos congestionamentos. E as soluções também não são novidades: investimento em transporte coletivo, menos carros nas ruas e aumento da cobertura vegetal – que contribui para a redução da poluição – são prioridades.
Pode ser difícil de acreditar, mas São Paulo já foi muito rica em vegetação, com extensas florestas de Mata Atlântica que formavam uma paisagem única. Hoje, resta 18% de cobertura vegetal nativa – em grande parte florestas secundárias – e o que sobrou ainda está mal distribuído. Temos grandes áreas verdes nos extremos norte e sul – os pulmões da cidade; outras áreas públicas, em praças e parques, como é o caso do Ibirapuera ou próximo ao Zoológico. Alguns bairros também são bem arborizados, mas boa parte das regiões, como as áreas centrais – no Brás e na Mooca, por exemplo – a paisagem é de completa aridez.
Nesse sentido, a presença das árvores na cidade e nos bairros faz toda a diferença. Elas aumentam o conforto térmico e o nosso bem-estar, além de deixar o ar mais puro e menos seco. Consequentemente, quem vive nos bairros com poucas ou nenhuma árvore acaba respirando um ar ainda pior. Na sua cidade, ou no seu bairro, como é o ar que você respira?
* Marcia Hirota é diretora-executiva da Fundação SOS Mata Atlântica.
** Publicado originalmente no Blog do Planeta e retirado do site Mercado Ético.
(Mercado Ético)
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